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Ex aluno do Nhonhô Braga publica emocionante carta- relato no jornal Folha de Piraju nos anos 80

Postado à, 1311 dias atrás | 11 minutos de leitura

Ex aluno do Nhonhô Braga  publica emocionante carta- relato no jornal Folha de Piraju nos anos 80
por Maria Ângela (Dattoli) Ramos
 
Há quase 40 anos uma carta interessante foi publicada na edição da Folha de Piraju de um sábado, datada de 8 de setembro de 1983. A referida carta foi publicada na sessão Carta aos Leitores e veio de Fortaleza. 
Para quem nasceu na década de 60, como eu, 1983 parece tão próximo... mas lá se vão 38 anos de estrada. 
Não sabemos se o autor está entre nós ainda, porque nos parece que já tinha certa idade, já avançada, quando a escreveu.
A preciosidade do resgate foi possível graças a um garimpeiro de histórias, João Dias Ramos, meu primo, do Acessa SP e a quem damos o crédito desta despretensiosa reportagem do passado.
A partir do achado de João, fica o registro da carta, possível também, graças ao imenso arquivo encadernado, do jornal Folha de Piraju, iniciado em 1965 que os atuais diretores José Carlos Carrara e José Elói Soares Caputo doaram sem parcimônias ao acervo municipal de Piraju na atual gestão. Lá no arquivo municipal, entenderam com desprendimento total, esse patrimônio cultural deveria ser abrigado. 
Para ambos, o patrimônio do jornal não é de quem passa por ele, mas da comunidade de Piraju, que foi parceira na sua construção. A carta é um importante e oportuno relato no mínimo por três pontos: resgata um pouco da história da escola e da cidade; foi enviada na ocasião e publicada na Folha de Piraju, jornal  que completou 55 anos de sua fundação neste ano de 2020, e também porque cita no final, um salve ao Rio Paranapanema, que a todos nós asila.
Sim, porque asilados nesta aldeia, uma ponte real para nós entre a terra e o céu, cada um optando por projetos de vida os mais diferenciados, todos nós ao permanecer neste lugar fizemos escolhas pessoais e aqui buscamos a felicidade, cumprimos nosso dever com o próximo e com nossa alma.
Afinal viemos ao mundo para ser nada mais que humanos.
 
Assim, vamos à carta em questão, que reproduzimos abaixo, endereçada ao diretor do Colégio Estadual de Piraju, o Nhonhô Braga:
 
Fortaleza, 8 de setembro de 1983
Ilmo Sr. Diretor do Colégio Estadual de Piraju – Saúde e Felicidade
Talvez tenha sido seu colega no Ginásio do Estado. Sou da 2ª turma de 1936. Muitas são as saudades daquele tempo e dos amigos que aí ficaram. Tenho aqui em mão uma reportagem de “O Cruzeiro” sobre o Ginásio, prédio novo. Aparecem um grupo de alunos, as instalações da sala de Ciências; a professora Da. Maria Amália Rocha Correia, Montauri Porto e eu. Estive aí pela última vez em 1942, ligeiramente. Caso o nosso diretor julgue oportuno, gostaria de ver divulgada esta carta no jornal da terra. 
Minha família e eu viemos de Bernardino de Campos, numa estrada de terra, de Jardineira. Moramos na Praça da Cadeia e começamos a estudar com Da. Balbina para o exame de admissão. A primeira turma do Ginásio funcionou num prédio adaptado na praça principal. Todos, 1ª e 2ª séries, inauguramos o prédio novo lá pelas bandas da saída para Fartura. Das conversas de aluno, lembro-me que o Presidente do Estado Armando Sales de Oliveira tinha instalado18 Ginásios no interior de São Paulo.
Hoje considero o corpo de professores que tivemos, simplesmente fabuloso: O professor François Dubois, engenheiro Suíço era o professor de matemática, casado com madame Tamara Casteli, Russa radicada em Paris era professora de Frances. Lecionava desenho o professor Lima Horta que casou-se depois com Helena, filha de madame Tamara. É incrível lembrar o que fazia o Mourão quando a madame num bom francês chamava alguém dizendo, vit,vir,vit. Enquanto o professor namorava na aula com a aluna, nós brincávamos a valer...
O Diretor era o Dr. Joaquim Porto (Joaquim Moreira Porto), o Dr. Armando, seu irmão, nosso grande professor de História e compadre de meu pai José Danziato. Agora eu não sei quem era o afilhado dele. O Dr. Abel Brandão, professor de Educação Física. Clovis Cerqueira, prof. De Música. Depois dele veio um sujeito com a cara de “poucos amigos”, pois tinha uma grande cicatriz no rosto, começou e terminou mal. No primeiro dia de aula, foi colocando os alunos brincalhões na frente e olhando para a classe. Quando já éramos meia dúzia, sem nenhum entendimento prévio começamos a fazer caretas para os outros. A risadaria foi geral, o professor saiu da classe e nunca mais voltou. O mestre de Português era o velho prof. Batista de Sanctis, alto, magro, caréca e entusiasmado. Dava aula com a mão direita enfiada na gola do paletó. Foi candidato nosso à coordenador do Grêmio que se fundava, concorrendo com Da. Ligia Furquin Sin, querida profª de Inglês. Houve grande movimentação na campanha eleitoral. Nós não sabíamos bem como era a coisa, porque era a primeira vez que enfrentávamos uma campanha política. Muitos discursos inflamados no Coreto da Praça, a mesma onde tínhamos levado o trote como bichos da primeira turma. Na confusão das ideias, depois no nosso vitorioso comício pro-Sanctis, alguém deu a infeliz sugestão de irmos a casa de Da. Lígia, prestar-lhe uma homenagem. Éramos inocentes demais, ela não atendeu e não nos recebeu...
Ao lado da nossa política estudantil que começava, frutificava a política real. Lembro-me quando o Poderoso Chefão do P.R.P., Ataliba Leonel foi derrotado pelo Partido Democrata. Além do foguetório e do comício nesta mesma praça, alguns queriam desagravar não sei o quê, indo estacionar em frente à casa da família Leonel, não fosse a mão enérgica do delegado Dr. Pinto Nogueira.
João Batista da Rocha Correia, prof. De Ciências, irmão de Da. Amália também professora, não me lembro de que, constituía com os demais um grupo maravilhoso. Quase todos vieram de fora. Parece que com a política mais tarde, houve mudança para pior, mas eu e meu irmão já tínhamos ido para Bauru. Dos colegas lembro-me do João Durval que seguiu a aeronáutica, talvez seja Cel. Aviador hoje. Da Morena Luiza, do judeu Chain Wols Pichipiorka, sempre o primeiro aluno de matemática. Gostaria de receber notícias dos demais queridos colegas que não me vêm à memória.
O Vigário era o Padre Gasparino Dantas, que frequentemente fazia uns leilões para a igreja. Lembro como se fosse hoje do Golpe de Estado de 1937, quando as 17 horas do dia 10 de novembro ao pé do rádio no bar do Jorge, ouvia-se a voz do presidente Vargas: brasileiros...
Retenho ainda a imagem da elegante e formosa Piraju, nas margens do caudaloso rio Paranapanema. Imagino como será vibrante e mais bela, naturalmente com suas escolas superiores, contribuindo para o progresso de São Paulo e do Brasil.
A todos os meus colegas e suas famílias o meu abraço.
Completei o curso ginasial em Bauru e dela segui para a Escola de Cadetes de Porto Alegre. Saindo oficial, ingressei no magistério Militar, sendo professor de História do Colégio Militar de Fortaleza – CE. Durante 21 anos resido em Fortaleza à Rua Monsenhor Bruno, 2449, tendo o máximo prazer em receber os que por aqui vierem. Aqui não faz frio, nem calor, a temperatura permanente é de 25º graus. Um abraço ao Sr. Diretor e aceite meus agradecimentos. 
Salve o Paranapanema.                                                   
 
 Milton Alves Danziato.
 
 
* As fotos desta reportagem pertencem ao Acervo Municipal  e à escola.