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03h58 | 18 de setembro de 2025
contato@folhadepiraju.comRECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA
IC nº 0382.0000141/2022
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, por meio de seu órgão de execução que ao final subscreve, no uso de suas atribuições constitucionais (artigo 127, caput, e artigo 129, III e IX, da Constituição Federal) e legais (artigo 27, caput, inciso IV, e parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 8.625∕93; artigo 6º, XX, da LC nº 75∕93, e no artigo 113, § 1º, da LCE nº 734∕93), escudado na Notícia de Fato em epígrafe, apresenta RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, notadamente do patrimônio público e social, da legalidade e da moralidade administrativa (art. 127, caput, e 129, III, da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que é função institucional do Ministério Público, de acordo com o artigo 129, III, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, promover o Inquérito Civil e a Ação Civil Pública, para a proteção do patrimônio público e social;
CONSIDERANDO que os cargos em comissão, por sua vez, representam exceção à regra e devem ter suas atribuições adequadas ao princípio da livre nomeação e investidura, bem como ao vínculo de confiança entre os seus ocupantes e aqueles que o nomeiam;
CONSIDERANDO que o legislador infraconstitucional, em qualquer dos níveis da federação, apenas pode instituir Cargos de Provimento em Comissão para atribuições de Direção, Chefia e Assessoramento, nos termos do artigo 37, V, da Constituição Federal, do artigo 115, inciso V, e do artigo 144, ambos da Constituição Estadual;
CONSIDERANDO que “direção” significa poder de comando, uma posição no topo dentro de uma hierarquia, normalmente, um departamento inteiro. Já 'chefia' seria o poder de decisão e autoridade em espectro de atuação menor que o da direção, normalmente, de uma seção do departamento. O chefe é o superior mais imediato dos servidores, ao passo que o diretor é mais mediato que este. E ambos sustentam o caráter de hierarquia dentro de uma instituição pública, e ambos são cargos de comando. Assessoria, por sua vez, corresponde à prestação de um auxílio à determinada autoridade, ou, em outras palavras, o assessor dá um suporte, seja de índole técnica ou empírica, a um superior;
CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal, ao analisar a ADI 6655/SE, tema 1.010 de Repercussão Geral, estabeleceu critérios para análise da constitucionalidade dos cargos em comissão. Segundo o Tribunal: a) A criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais; b) tal criação deve pressupor a necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado; c) o número de cargos comissionados criados deve guardar proporcionalidade com a necessidade que eles visam suprir e com o número de servidores ocupantes de cargos efetivos no ente federativo que os criar; e d) as atribuições dos cargos em comissão devem estar descritas, de forma clara e objetiva, na própria lei que os instituir;
CONSIDERANDO que este Inquérito Civil foi instaurado em 21 de novembro de 2023, a partir de Notícia de Fato de 28 de junho de 2022, para apurar a existência de cargos de provimento em comissão cujas atribuições não correspondem às funções de direção, chefia e assessoramento, configurando burla à regra do concurso público (fls. 01/03);
CONSIDERANDO que, após representação desta Promotoria de Justiça, a Procuradoria-Geral de Justiça ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2145502-96.2024.8.26.0000 em face de dispositivos da Lei Complementar Municipal nº 1.862/2016;
CONSIDERANDO que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em v. acórdão proferido na referida ADI em 30 de abril de 2025, julgou a ação parcialmente procedente para declarar a inconstitucionalidade de diversos cargos comissionados, por entender que suas atribuições são de natureza técnica, burocrática ou operacional, violando a regra do concurso público;
CONSIDERANDO que a referida decisão transitou em julgado em 24 de junho de 2025, tornando-se definitiva e de cumprimento obrigatório;
CONSIDERANDO que, não obstante a clareza da decisão judicial, o Poder Executivo Municipal sancionou a Lei Municipal nº 2.121/2025, a qual, a pretexto de reestruturar a administração, recriou cargos comissionados com as mesmas atribuições daqueles declarados inconstitucionais, apenas alterando suas nomenclaturas, numa clara e deliberada tentativa de contornar o julgado do TJSP;
CONSIDERANDO que a análise preliminar da nova legislação revela que cargos como “Diretor de Licitações e Contratos”, “Diretor de Recursos Humanos” e “Chefe do Setor de Enfermagem”, entre outros, mantêm a essência técnica e operacional das funções anteriormente invalidadas, o que afronta diretamente a tese de observância obrigatória fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1.010 de Repercussão Geral;
CONSIDERANDO que a Câmara Municipal de Óleo aprovou o respectivo projeto de lei mesmo diante de parecer jurídico contrário de sua própria Procuradoria, que apontou a persistência das inconstitucionalidades (fls. 663/666);
CONSIDERANDO que o descumprimento da Recomendação Administrativa do Ministério Público, regulamentada pelos artigos 94 a 100 da Resolução nº 1.342/2021-CPJ, caracteriza dolo específico da prática dos atos descritos na Lei nº 8.429/92;
CONSIDERANDO que é função institucional do Ministério Público, de acordo com o artigo 129, III, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, promover o Inquérito Civil e a Ação Civil Pública, para a proteção do patrimônio público e social;
CONSIDERANDO que é dever do Administrador Público respeitar os princípios regentes previstos no art. 37, caput, da CF/88, essenciais à boa gestão da res publicae, sob pena de responder pela prática de ato de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF/88), conforme o respectivo tipo em que indica (arts. 9º a 11, da Lei nº 8.429/92);
CONSIDERANDO que, segundo o mestre Hely Lopes Meirelles, o princípio do interesse público ou supremacia do interesse público “está intimamente ligado ao da finalidade, sendo que a primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado se justifica pela busca do interesse geral, ou seja, da coletividade”. (Direito Administrativo Brasileiro, Editora Malheiros, 39ª Edição, 2.013, págs. 109/110);
CONSIDERANDO o papel institucional do Ministério Público de defesa do patrimônio público e da probidade administrativa (art. 127, caput e art. 129, III da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que o Ministério Público se legitima a toda e qualquer demanda que vise à defesa do patrimônio público, inclusive para "anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou entidades privadas de que participem" (art. 25, IV, b, da Lei 8.625/93) e para a ação que busca a aplicação das sanções aplicáveis em virtude dos atos de improbidade administrativa, de que trata o § 4º, do art. 37 da Constituição Federal (art. 1º, da Lei 8.429/92);
CONSIDERANDO a atuação do Ministério Público voltada à reafirmação da eficácia dos princípios estabelecidos no art. 37 da Constituição Federal;
CONSIDERANDO o rol de diretrizes da "Carta de Brasília" em que merece destaque a "priorização de atuação preventiva, de modo a atuar programaticamente para combater ilícitos que possam gerar situação de lesão ou de ameaça aos direitos fundamentais afetos à atuação do Ministério Público, priorizando, para tanto, medidas extrajudiciais e judiciais que sejam efetivas e eficientes para evitar essa prática";
CONSIDERANDO que, nos termos do artigo 6º, da Resolução nº 1.342/21-CPJ, a recomendação é instrumento de atuação extrajudicial do Ministério Público por intermédio do qual este expõe, em ato formal, razões fáticas e jurídicas sobre determinada questão, com o objetivo de persuadir o destinatário a praticar ou deixar de praticar determinados atos em benefício da melhoria dos serviços públicos e de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos pela instituição, atuando, assim, como instrumento de prevenção de responsabilidades ou correção de condutas;
CONSIDERANDO os princípios informadores da Recomendação Administrativa, elencados no artigo 2º da Resolução nº 164/17 do Conselho Nacional do Ministério Público;
CONSIDERANDO que, nos termos do artigo 3º da Resolução nº 164/17 do Conselho Nacional do Ministério Público, o Ministério Público, de ofício ou mediante provocação, nos autos de inquérito civil, de procedimento administrativo ou procedimento preparatório, poderá expedir recomendação objetivando o respeito e a efetividade dos direitos e interesses que lhe incumba defender e, sendo o caso, a edição ou alteração de normas;
CONSIDERANDO que, nos termos do artigo 94, caput, da Resolução nº 1.342/21-CPJ, no exercício da tutela dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, poderá o presidente do inquérito civil expedir recomendação, sem caráter coercitivo, com o objetivo de persuadir o destinatário a praticar ou deixar de praticar determinados atos em benefício da melhoria dos serviços públicos e de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos pela Instituição;
CONSIDERANDO, por fim, o descaso e o desrespeito do Chefe do Poder Executivo para com a atuação deste órgão ministerial e com a autoridade de uma decisão do Poder Judiciário, evidenciado pelo histórico de três anos de acompanhamento do caso e pela recente solicitação de um novo prazo de quatro meses para regularizar a situação, o que demonstra o dolo específico em manter uma estrutura administrativa ilegal e imoral;
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO RECOMENDA a Vossa Excelência, Prefeito Municipal de Óleo, a adoção das seguintes providências, de forma imediata e improrrogável:
Fica Vossa Excelência advertido de que o não atendimento a esta Recomendação no prazo estipulado ensejará a adoção de todas as medidas judiciais cabíveis por parte do Ministério Público, notadamente o ajuizamento de Ação Civil Pública.
Requisita-se que Vossa Excelência informe a esta Promotoria de Justiça, por escrito e no prazo de 5 (cinco) dias a contar do recebimento desta, as providências adotadas para o seu fiel cumprimento.
Requisita-se sua ampla e imediata divulgação, no prazo máximo de 05 (cinco) dias, na homepage do sítio eletrônico do Município de Óleo e na homepage do sítio eletrônico da Câmara Municipal de Vereadores de Óleo e em jornal de circulação local.
Cópias da presente Recomendação Administrativa deverá ser encaminhada à Presidência da Câmara dos Vereadores de Óleo para conhecimento.
Piraju, 19 de agosto de 2025.
FRANCISCO ANTONIO NIERI MATTOSINHO
Promotor de Justiça
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Documento assinado eletronicamente por FRANCISCO ANTONIO NIERI MATTOSINHO, em 19/08/2025 às 15:32.
Para verificar a autenticidade deste documento, acesse o serviço pelo Atendimento ao Cidadão e à Cidadã, no site do Ministério Público do Estado de São Paulo, e informe o nº do procedimento 0382.0000141/2022 e código e6e8a100-04d7-4701-8055-130769e5ccf9.
(A Recomendação poderá ser baixada em PDF clicando no link azul a seguir nesta plataforma)
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