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RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA IC nº 0382.0000141/2022 MUNICÍPIO DO ÓLEO / MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO publicação 23h56 de 19/08/2025

RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA

 

 

IC nº 0382.0000141/2022

 

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, por meio de seu órgão de execução que ao final subscreve, no uso de suas atribuições constitucionais (artigo 127, caput, e artigo 129, III e IX, da Constituição Federal) e legais (artigo 27, caput, inciso IV, e parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 8.625∕93; artigo 6º, XX, da LC nº 75∕93, e no artigo 113, § 1º, da LCE nº 734∕93), escudado na Notícia de Fato em epígrafe, apresenta RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.

CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, notadamente do patrimônio público e social, da legalidade e da moralidade administrativa (art. 127, caput, e 129, III, da Constituição Federal);

CONSIDERANDO que é função institucional do Ministério Público, de acordo com o artigo 129, III, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, promover o Inquérito Civil e a Ação Civil Pública, para a proteção do patrimônio público e social;

CONSIDERANDO que os cargos em comissão, por sua vez, representam exceção à regra e devem ter suas atribuições adequadas ao princípio da livre nomeação e investidura, bem como ao vínculo de confiança entre os seus ocupantes e aqueles que o nomeiam;

CONSIDERANDO que o legislador infraconstitucional, em qualquer dos níveis da federação, apenas pode instituir Cargos de Provimento em Comissão para atribuições de Direção, Chefia e Assessoramento, nos termos do artigo 37, V, da Constituição Federal, do artigo 115, inciso V, e do artigo 144, ambos da Constituição Estadual;

CONSIDERANDO que “direção” significa poder de comando, uma posição no topo dentro de uma hierarquia, normalmente, um departamento inteiro. Já 'chefia' seria o poder de decisão e autoridade em espectro de atuação menor que o da direção, normalmente, de uma seção do departamento. O chefe é o superior mais imediato dos servidores, ao passo que o diretor é mais mediato que este. E ambos sustentam o caráter de hierarquia dentro de uma instituição pública, e ambos são cargos de comando. Assessoria, por sua vez, corresponde à prestação de um auxílio à determinada autoridade, ou, em outras palavras, o assessor dá um suporte, seja de índole técnica ou empírica, a um superior;

CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal, ao analisar a ADI 6655/SE, tema 1.010 de Repercussão Geral, estabeleceu critérios para análise da constitucionalidade dos cargos em comissão. Segundo o Tribunal: a) A criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais; b) tal criação deve pressupor a necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado; c) o número de cargos comissionados criados deve guardar proporcionalidade com a necessidade que eles visam suprir e com o número de servidores ocupantes de cargos efetivos no ente federativo que os criar; e d) as atribuições dos cargos em comissão devem estar descritas, de forma clara e objetiva, na própria lei que os instituir;

CONSIDERANDO que este Inquérito Civil foi instaurado em 21 de novembro de 2023, a partir de Notícia de Fato de 28 de junho de 2022, para apurar a existência de cargos de provimento em comissão cujas atribuições não correspondem às funções de direção, chefia e assessoramento, configurando burla à regra do concurso público (fls. 01/03);

CONSIDERANDO que, após representação desta Promotoria de Justiça, a Procuradoria-Geral de Justiça ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2145502-96.2024.8.26.0000 em face de dispositivos da Lei Complementar Municipal nº 1.862/2016;

CONSIDERANDO que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em v. acórdão proferido na referida ADI em 30 de abril de 2025, julgou a ação parcialmente procedente para declarar a inconstitucionalidade de diversos cargos comissionados, por entender que suas atribuições são de natureza técnica, burocrática ou operacional, violando a regra do concurso público;

CONSIDERANDO que a referida decisão transitou em julgado em 24 de junho de 2025, tornando-se definitiva e de cumprimento obrigatório;

CONSIDERANDO que, não obstante a clareza da decisão judicial, o Poder Executivo Municipal sancionou a Lei Municipal nº 2.121/2025, a qual, a pretexto de reestruturar a administração, recriou cargos comissionados com as mesmas atribuições daqueles declarados inconstitucionais, apenas alterando suas nomenclaturas, numa clara e deliberada tentativa de contornar o julgado do TJSP;

CONSIDERANDO que a análise preliminar da nova legislação revela que cargos como “Diretor de Licitações e Contratos”, “Diretor de Recursos Humanos” e “Chefe do Setor de Enfermagem”, entre outros, mantêm a essência técnica e operacional das funções anteriormente invalidadas, o que afronta diretamente a tese de observância obrigatória fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1.010 de Repercussão Geral;

CONSIDERANDO que a Câmara Municipal de Óleo aprovou o respectivo projeto de lei mesmo diante de parecer jurídico contrário de sua própria Procuradoria, que apontou a persistência das inconstitucionalidades (fls. 663/666);

CONSIDERANDO que o descumprimento da Recomendação Administrativa do Ministério Público, regulamentada pelos artigos 94 a 100 da Resolução nº 1.342/2021-CPJ, caracteriza dolo específico da prática dos atos descritos na Lei nº 8.429/92;

CONSIDERANDO que é função institucional do Ministério Público, de acordo com o artigo 129, III, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, promover o Inquérito Civil e a Ação Civil Pública, para a proteção do patrimônio público e social;

CONSIDERANDO que é dever do Administrador Público respeitar os princípios regentes previstos no art. 37, caput, da CF/88, essenciais à boa gestão da res publicae, sob pena de responder pela prática de ato de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF/88), conforme o respectivo tipo em que indica (arts. 9º a 11, da Lei nº 8.429/92);

CONSIDERANDO que, segundo o mestre Hely Lopes Meirelles, o princípio do interesse público ou supremacia do interesse público “está intimamente ligado ao da finalidade, sendo que a primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado se justifica pela busca do interesse geral, ou seja, da coletividade”. (Direito Administrativo Brasileiro, Editora Malheiros, 39ª Edição, 2.013, págs. 109/110);

CONSIDERANDO o papel institucional do Ministério Público de defesa do patrimônio público e da probidade administrativa (art. 127, caput e art. 129, III da Constituição Federal);

CONSIDERANDO que o Ministério Público se legitima a toda e qualquer demanda que vise à defesa do patrimônio público, inclusive para "anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou entidades privadas de que participem" (art. 25, IV, b, da Lei 8.625/93) e para a ação que busca a aplicação das sanções aplicáveis em virtude dos atos de improbidade administrativa, de que trata o § 4º, do art. 37 da Constituição Federal (art. 1º, da Lei 8.429/92);

CONSIDERANDO a atuação do Ministério Público voltada à reafirmação da eficácia dos princípios estabelecidos no art. 37 da Constituição Federal;

CONSIDERANDO o rol de diretrizes da "Carta de Brasília" em que merece destaque a "priorização de atuação preventiva, de modo a atuar programaticamente para combater ilícitos que possam gerar situação de lesão ou de ameaça aos direitos fundamentais afetos à atuação do Ministério Público, priorizando, para tanto, medidas extrajudiciais e judiciais que sejam efetivas e eficientes para evitar essa prática";

CONSIDERANDO que, nos termos do artigo 6º, da Resolução nº 1.342/21-CPJ, a recomendação é instrumento de atuação extrajudicial do Ministério Público por intermédio do qual este expõe, em ato formal, razões fáticas e jurídicas sobre determinada questão, com o objetivo de persuadir o destinatário a praticar ou deixar de praticar determinados atos em benefício da melhoria dos serviços públicos e de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos pela instituição, atuando, assim, como instrumento de prevenção de responsabilidades ou correção de condutas;

CONSIDERANDO os princípios informadores da Recomendação Administrativa, elencados no artigo 2º da Resolução nº 164/17 do Conselho Nacional do Ministério Público;

CONSIDERANDO que, nos termos do artigo 3º da Resolução nº 164/17 do Conselho Nacional do Ministério Público, o Ministério Público, de ofício ou mediante provocação, nos autos de inquérito civil, de procedimento administrativo ou procedimento preparatório, poderá expedir recomendação objetivando o respeito e a efetividade dos direitos e interesses que lhe incumba defender e, sendo o caso, a edição ou alteração de normas;

CONSIDERANDO que, nos termos do artigo 94, caput, da Resolução nº 1.342/21-CPJ, no exercício da tutela dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, poderá o presidente do inquérito civil expedir recomendação, sem caráter coercitivo, com o objetivo de persuadir o destinatário a praticar ou deixar de praticar determinados atos em benefício da melhoria dos serviços públicos e de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos pela Instituição;

CONSIDERANDO, por fim, o descaso e o desrespeito do Chefe do Poder Executivo para com a atuação deste órgão ministerial e com a autoridade de uma decisão do Poder Judiciário, evidenciado pelo histórico de três anos de acompanhamento do caso e pela recente solicitação de um novo prazo de quatro meses para regularizar a situação, o que demonstra o dolo específico em manter uma estrutura administrativa ilegal e imoral;

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO RECOMENDA a Vossa Excelência, Prefeito Municipal de Óleo, a adoção das seguintes providências, de forma imediata e improrrogável:

  1. EXONERAR, no prazo máximo e improrrogável de 5 (cinco) dias, todos os servidores ocupantes dos cargos comissionados listados abaixo, recriados pela Lei Municipal nº 2.121/2025, por possuírem as mesmas atribuições daqueles já declarados inconstitucionais pelo Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo na ADI nº 2145502-96.2024.8.26.0000:
    1. Chefe do Setor de Meio Ambiente
    2. Chefe do Setor de Nutrição
    3. Chefe do Setor Administrativo de Saúde
    4. Diretor de Agricultura (anteriormente Chefe do Serviço de Agricultura)
    5. Diretor de Esportes e Lazer (anteriormente Chefe do Serviço de Esporte e Lazer)
    6. Diretor de Lançadoria
    7. Chefe de Serviços Rurais (anteriormente Chefe de Obras e Transportes)
    8. Chefe do Serviço de Fiscalização (anteriormente Chefe do Serviço de Fiscalização de Vias e Logradouros)
    9. Diretor de Recursos Humanos (anteriormente Chefe do Serviço de Recursos Humanos)
    10. Diretor de Administração (anteriormente Chefe do Serviço de Administração)
    11. Diretor de Licitações e Contratos (anteriormente Chefe do Serviço de Licitações e Convênios)
    12. Diretor de Compras (anteriormente Chefe do Serviço de Compras)
    13. Chefe do Setor de Enfermagem
    14. Chefe do CRAS
    15. Diretor de Engenharia, Obras e Serviços Públicos (anteriormente Chefe do Serviço de Engenharia)
  2. ENCAMINHAR à Câmara Municipal, no prazo máximo e improrrogável de 5 (cinco) dias, Projeto de Lei com o objetivo de:
    1. a) Extinguir formalmente os cargos comissionados inconstitucionais mencionados no item 1;
    2. b) Criar os respectivos cargos de provimento efetivo, com atribuições de natureza técnica, burocrática e operacional, a serem preenchidos mediante a realização de concurso público.

Fica Vossa Excelência advertido de que o não atendimento a esta Recomendação no prazo estipulado ensejará a adoção de todas as medidas judiciais cabíveis por parte do Ministério Público, notadamente o ajuizamento de Ação Civil Pública.

Requisita-se que Vossa Excelência informe a esta Promotoria de Justiça, por escrito e no prazo de 5 (cinco) dias a contar do recebimento desta, as providências adotadas para o seu fiel cumprimento.

Requisita-se sua ampla e imediata divulgação, no prazo máximo de 05 (cinco) dias, na homepage do sítio eletrônico do Município de Óleo e na homepage do sítio eletrônico da Câmara Municipal de Vereadores de Óleo e em jornal de circulação local.

Cópias da presente Recomendação Administrativa deverá ser encaminhada à Presidência da Câmara dos Vereadores de Óleo para conhecimento.

Piraju, 19 de agosto de 2025.

 

FRANCISCO ANTONIO NIERI MATTOSINHO

Promotor de Justiça

 

 

 

 

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Documento assinado eletronicamente por FRANCISCO ANTONIO NIERI MATTOSINHO, em 19/08/2025 às 15:32.

Para verificar a autenticidade deste documento, acesse o serviço pelo Atendimento ao Cidadão e à Cidadã, no site do Ministério Público do Estado de São Paulo, e informe o nº do procedimento 0382.0000141/2022 e código e6e8a100-04d7-4701-8055-130769e5ccf9.

 (A Recomendação poderá ser baixada em PDF clicando no link azul a seguir nesta plataforma)


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