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08/AGO - 08
AGO
OS FANTASMAS SE DIVERTEM, POR CARLINHOS BARREIROS

 
Causou um certo frisson na mídia tupiniquim,  na recente temporada, o vídeo (peça de propaganda) que a VolksWagen do Brasil lançou para comemorar os 70 anos do lançamento da Kombi no país. Sim, o veículo em forma de charuto e sem frente que os engraçadinhos batizaram de “Jesus está chamando” mereceu todas as honrarias da montadora alemã. 
No clipe, a cantora Elis Regina, morta há 41 anos, dirige uma Kombi velha enquanto canta o clássico de seu repertório “Como Nossos Pais”, de Belchior. Ao lado, mas numa Kombi elétrica, modelo 2023, sua filha, a também cantora Maria Rita, dirige e canta a mesma canção, em sintonia com a mãe. Filmadas lado a lado numa estrada rumo ao infinito, os veículos juntos pretendem passar a imagem do Velho e do Novo, pois, como diz na letra da música cantada por mãe e filha, “o novo sempre vem”. 
Elis, lógico, foi recriada por um programa que utiliza inteligência artificial. Dá prá enganar bem. Maria Rita, é óbvio, está ao natural e parece bastante simpática, se bem que sempre afirmou detestar cantar músicas do repertório da genitora famosa. A Volks não revelou o cachê de Maria Rita e nem quanto pagou a mais para recriar Elis no computador, mas não deve ter sido pouca coisa, para a filha mudar de ideia assim de repente. Eu, particularmente, gostei bastante do resultado final conseguido. Emocionante sem ser um melodrama barato, resgata Elis, Belchior, a canção que é um hino e os charmosos Anos 70, aqueles que parecem não querer acabar nunca.    
Detratores do comercial chiaram, berrando que a música de Belchior usada, que esbravejava contra o sistema, acabou sendo utilizada pelo próprio, num processo de autofagia lucrativo. Bem, fazer o que ? 
São as regras do mercado. Outra parte da galera do contra achou um tanto mórbido tirar Elis da tumba para aparecer linda & saltitante num comercial de carros. Besteira. Quem deveria reclamar disso, no caso, teria que ser a própria filha e os seus irmãos, que não abriram a boca, decerto calada pelos royalties recebidos da montadora germânica.
Não é a primeira vez que mortos cantam junto com os vivos, com uma mãozinha dada por programas de computador. Natalie Cole, filha de Nat King Cole, cantou quase tudo do repertório dele junto com ele, mesmo Nat estando na categoria de presunto já há um belo período de tempo. A versão de ambos para “Unforgetable” ficou show de bola, trazendo a linda canção de volta às paradas quando lançada. Natalie, depois, morreria precocemente, calando de vez os interessantes duetos com papai. 
Celine Dion, poderosa, quis gravar um dueto com ninguém nada menos que The Voice: Frank Sinatra, morto há décadas. E conseguiu: juntos (re) lançaram a mítica “All The Way” e fica difícil julgar quem está melhor ali, nessa reunião de feras. Reza a lenda que o espólio de Sinatra só concordou com o arranjo porque seria Celine quem estaria cantando: se fosse uma outra qualquer, tipo Mariah Carey ou similares, nem pensar. Mas a cantora canadense, que já fizera dueto com as maiores vozes masculinas do planeta está completamente à vontade no cover, dando de vez em quando um baile em Sinatra, a Voz. Será ?
Paul McCartney, um dos dois Beatles ainda vivo, anunciou outro dia que a inteligência artificial vai dar uma mãozinha para “recriar” uma nova canção do quarteto inglês, já que o próprio teria encontrado um “rascunho” de letra perdida e pretende lançar. Bem, então a I. A.  vai ter que se esforçar para recriar as vozes de Lennon e George Harrison, que já viraram estrelinha faz tempo. Se vivo, John jamais concordaria com essa baixaria, tenho certeza. O mundo precisa de mais uma canção dos Beatles? Claro que não. O legado que eles deixaram sempre será único e insubstituível, com mais de 300 músicas. Para que mais uma ? É certo que Paul já tinha feito isso anos atrás, em 1995, quando “encaixou” a voz de John (assassinado em 1980) encontrada numa demo precária de 1977 em outra canção perdida, a sorumbática “Free As A Bird”, anunciada na época de seu lançamento como “a retomada do sonho que não acabou”. Sei. Deu em nada. Mais uma música dos Beatles, bem longe de “Eleanor Rigby”, “Come Together” ou “Penny Lane”. 
Pasmo, leio que o Nordeste brasileiro, sempre avant garde, recriou Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, morto há mais de 30 anos, usando outra vez a inteligência artificial. O C G precisou de 40 dias para conseguir o resultado final: foram utilizadas 60 imagens do rosto do cantor e mais de 800 minutos de gravações com a sua voz, tiradas de mais de cem músicas, para que o Rei do Baião ressuscitasse by mídia digital num show, ao lado de João Gomes, cantor e compositor de piseiro. Será que cantaram “Assum Preto”? Ou “Asa Branca”? Minhas informações apontam para um dueto em “Eu Tenho a Senha”, de autoria do primeiro, que teve música na trilha da novela da Globo “Pantanal”, no ano passado.  
Não se conhece (ainda) os limites para o uso da inteligência artificial. Parece que a geringonça pode tudo. Em “O Exterminador do Futuro” (1984), de James Cameron, ela cresce tanto que acaba dizimando a raça humana. Será? Bem, se for, não estou nem aí: me deixem ouvir e ver Billie Holiday recriada pela Inteligência  Artificial.  Afinal, não se pode ter tudo. 
 
O autor deste texto  Carlinhos Barreiros iniciou sua vida de jornalista na Folha de Piraju no final da década de 80, por sugestão da professora Mariinha D’ercolle e a convite da editora da Folha de Piraju, Maria Ângela (Laka) e já era polêmico. Carlinhos era um professor primário dos melhores, tornou-se jornalista e escritor colaborador de várias plataformas digitais.  Escreveu o livro “Insânia, o lado escuro da Lua” e prepara uma nova obra para breve.  Já venceu concursos de contos e foi colaborador dos jornais Folha de Piraju, Observador e Jornal da Cidade. Continua escrevendo de forma especial com a Folha de Piraju. É também integrante da equipe regular do blog  Farol Notícias, de Itaí. Também escreve para  um projeto do Jornal da USP.